19.3.09


Só ontem me dei conta que em Lisboa percorro as ruas de olhos no chão. Quando os ergo e olho a multidão, faço-o sobre as centenas de cabeças, olho entre a linha que as separa do céu e o céu em si, querendo achar graça aos prédios, acabando por me encantar com a paisagem urbana. Ontem, no Chiado, entrei na Igreja dos Mártires, pela primeira vez não foi a multidão ou a rua que me atraíram para si, e dentro da nave do edifício percebi que este era um sinal de enorme diferença em mim, ter medo de uma recordação pode ser também temer uma cidade. Não existe uma forma prática de enfrentarmos os medos, penso ter feito o que me competia até aqui, mas ontem, antes de entrar no comboio, dei por mim a pegar no telemóvel.


- Estou?


- Olá, estás bem? Olha, só te queria dizer uma coisa rápida, até porque tenho de entrar no comboio.


- É? Então?


- Só te queria dizer, e lembrei-me disto enquanto olhava agora para as janelas do alfa (riso nervoso) : deve ter sido muito difícil para ti, no tempo em que estavamos juntos, perceberes que eu ficava feliz quando ia ao Porto e triste quando chegava aqui. Deve ter sido difícil.


- Pois (aquele sorriso/esgar contido de confirmação de algo óbvio).


- E tenho outra notícia, para aligeirar a coisa, pá! Fui contratada!


- Boa! A sério?! E então conta lá como vai ser. (...) Vês?!, afinal até vais para melhor!


O resto não preciso contar. Entrei no comboio tal como quando saía dele há 3 anos atrás tantas vezes, a chorar. Mas desta vez não te vi, desta vez vejo-me a mim, o choro é um choro de vida e constatações, já não é um choro frágil ou desorientado, se é que o choro não tem sempre um pouco de tudo à mistura. É um choro de respirar fundo, de pensar, pronto, fiz o que tinha a fazer. Talvez da próxima vez visitar Lisboa me seja confortável. Venha o futuro.




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